Foto: Abner Garcia / Let's Money
Foto: Abner Garcia / Let's Money

Na jornada do empreendedorismo no Brasil, Gonzalo Parejo percorreu um caminho nada óbvio até fundar a Kamino. Espanhol, chegou ao País em 2011 depois de passar pela crise financeira de 2008 gerenciando a reestruturação de uma grande empresa imobiliária na Europa. Foi no Brasil, porém, que encontrou o terreno fértil e complexo para desenvolver soluções tecnológicas voltadas ao setor financeiro.

“Com o mesmo número de empregados, uma empresa média no Brasil fatura três a quatro vezes menos que nos países desenvolvidos. Isso não é problema de talento, é problema de produtividade, e a gestão financeira está no centro disso”, afirma.

Durante um projeto de Private Equity entre 2020 e 2021, Parejo analisou dezenas de médias empresas. Identificou um padrão: negócios rentáveis, mas com práticas financeiras extremamente manuais. “Ou era tudo no Excel, ou usavam ERPs que funcionavam como patos — nadam, andam e voam, mas não fazem nada bem”, brinca.

A partir dessa constatação, ele se reconectou com antigos colegas da época do Groupon e fundou a Kamino ao lado de Benjamin Gleason, Guto e Rodrigo Perenha (ex-diretor de engenharia do Mercado Pago). A missão era clara: construir a principal plataforma de gestão financeira para médias empresas no Brasil, unindo software e serviços bancários de forma nativa.

Primeiro passo: apagar incêndios

O início foi pragmático. A Kamino escolheu atacar primeiro o setor de contas a pagar. Depois vieram os módulos de contas a receber e conciliação, com o objetivo de criar uma base sólida de dados financeiros confiáveis e atualizados diariamente.

“É onde a dor é mais aguda: empresas médias têm dezenas de pagamentos por dia, múltiplos CNPJs, diferentes bancos e fazem tudo em planilha”, explica Parejo.

Com essa infraestrutura, a empresa consegue liberar tempo da equipe financeira para que possa se concentrar em controle, eficiência e tomada de decisão. “Antes, era comum ter uma pessoa só para fazer pagamentos e outra para conciliação no fim do mês. Hoje, nossos clientes têm a conciliação diária e conseguem focar no que importa: como gerir melhor nos próximos 30 dias“, afirma.

A força do modelo integrado

O grande diferencial da Kamino é a integração entre software e infraestrutura bancária. A plataforma oferece conta e cartão próprios, mas também se conecta a bancos terceiros. “Queremos ser o orquestrador do ecossistema. O cliente decide com quem quer se relacionar — nosso papel é integrar tudo”, resume. Já são mais de R$ 15 bilhões processados em conciliação, com mais de 3 mil empresas usando a plataforma.

Foto: Abner Garcia / Let’s Money

Na prática, isso significa que a gestão de caixa acontece em tempo real. O gestor pode acompanhar categorias de gasto, centros de custo, rateios e orçamentos de forma granular. Os cartões corporativos (físicos e virtuais) permitem controle por colaborador e por orçamento, com conciliação automática.

Expansão estratégica: do operacional ao estratégico

Agora, a Kamino mira no Office do CFO. Com dados atualizados e estruturados, a empresa quer transformar a plataforma em um cockpit de decisão para as lideranças financeiras.

“Já somos o queridinho do analista e da gerente financeira. O próximo passo é conquistar o CFO, com mais governança, segurança e controle sobre os fluxos de aprovação”, afirma Gonzalo.

A IA é parte central dessa visão. “Estamos testando agentes de IA para oferecer análises e relatórios personalizados. A ideia é que o CFO tenha uma visão instantânea da saúde financeira e das oportunidades de otimização da empresa”, explica.

Visão de produto e modelo de negócio

O modelo de precificação da Kamino é indexado ao volume financeiro movimentado pela empresa. “Cresceu, paga mais; retraiu, paga menos. A gente anda junto com o cliente”, diz Parejo. O onboarding também é parte crítica da proposta: em até 15 dias, o cliente já começa a perceber valor com automações e controle financeiro real.

E para quem já usa ERP? “A gente se integra. O importante é garantir que os dados estejam atualizados e confiáveis para gerar os relatórios e insights que entregamos.”

Open Finance, regulação e o futuro

A Kamino acompanha de perto o avanço do Open Finance para PJ, embora reconheça que ainda há entraves técnicos e regulatórios. “Hoje, não funciona. Mas quando funcionar, estaremos prontos para incorporar”, diz. Para ele, o papel agnóstico da empresa a posiciona como player ideal para se tornar o hub de orquestração das finanças empresariais.

“O Banco Central está tornando o ambiente mais robusto, e isso é ótimo para operadores sérios como a gente.”

Brasil como laboratório global

Para Gonzalo Parejo, o Brasil tem a chance de liderar uma transformação na gestão financeira B2B tão profunda quanto foi a revolução liderada pelo Nubank no B2C. “Nos próximos três a cinco anos, a relação das empresas com dinheiro, banco e gestão vai mudar radicalmente. Os bancos vão ficar em segundo plano. O software e a IA vão liderar a experiência do cliente e da gestão.”

Essa visão de futuro, segundo ele, exige um novo perfil profissional: líderes que saibam coordenar times humanos e agentes de IA, numa operação onde decisões financeiras são tomadas com precisão e velocidade.

“A era da planilha está acabando. A empresa que quiser crescer, vai precisar de inteligência, e a Kamino quer ser esse cérebro.”

Gabriel Rios

Editor-chefe

Formado em jornalismo pela Universidade Federal da Bahia, também realizou o curso de Jornalismo Econômico do Estadão. Foi editor do BP Money e repórter do Bahia Notícias.

Formado em jornalismo pela Universidade Federal da Bahia, também realizou o curso de Jornalismo Econômico do Estadão. Foi editor do BP Money e repórter do Bahia Notícias.